A cidade pede atenção, os carros pedem passagem, o barulho invade o espaço físico e mental. Nenhum desses pedidos vem com aviso prévio e muitas vezes sequer são percebidos.
A cidade pede atenção, os carros pedem passagem, o barulho invade o espaço físico e mental. Nenhum desses pedidos vem com aviso prévio e muitas vezes sequer são percebidos. O cenário urbano infiltra-se na rotina por todos os lados e vieses. Ainda que esses elementos passem despercebidos ou assimilados de forma natural, eles requerem atenção e esforço mental. Isso, somado à perspectiva de que 70% da população esteja morando nas cidades até 2050, faz com que cada vez mais sejam feitos estudos que refletem a relação entre planejamento urbano, arquitetura e saúde mental.
Os estudos somam esforços para entender como a vida urbana afeta o desenvolvimento cognitivo dos habitantes e qual o papel da cidade no desenvolvimento de transtornos mentais. Por outro lado, existem também pesquisas que pontuam os aspectos positivos dos centros urbanos. Elas analisam a inter-relação entre a vida humana e o ambiente que escolhemos para morar, do estresse causado por engarrafamentos até o bem-estar proveniente da arborização urbana.
O cérebro se adaptou às cidades
A igual divisão entre o espaço rural e urbano que o povo Himba tomou, na Namíbia, serviu como base deestudopara cientistas da Universidade de Londres. Em um dos experimentos, os pesquisadores empregaram uma tarefa básica de atenção espacial. Todos os participantes precisavam seguir um alvo em uma tela, indicado por setas, e deveriam ignorar as setas que apontavam em outras direções. Os habitantes que habitavam a zona rural ou mais remota apresentaram mais foco durante a tarefa.
A conclusão dos cientistas foi que o cérebro das pessoas que vivem no interior parece pronto a focar imediatamente em uma tarefa apresentada. Em contrapartida, os habitantes da cidade mostram-se preparados para explorar o cenário em constante mudança da vida urbana. Essa distinção, no entanto, demonstra apenas como a cidade condiciona seus moradores a funcionarem de maneira diferente.
Existem, como essa, diversas outras análises sobre o ambiente urbano. Estudos sobre a densidade, o uso do solo, a segurança viária, o desenho urbano e o impacto dos transportes tendem a apresentar bons resultados no ramo da saúde em geral, seja em impactos sociais ou econômicos, mas são poucos os estudos que levam em conta a saúde mental. Existem aprofundamentos que levam em conta a poluição sonora e visual e a falta de acesso a espaços verdes e o impacto que isso causa para o bem-estar das pessoas.
Essa foi a premissa adotada por um grupo de pesquisadores italianos para analisar a relação entre o ambiente urbano e o impacto na saúde mental dos habitantes. Independentemente dos papéis desempenhados pelos bairros e a desvantagem social individual. A análise foi feita a partir das variações na prescrição de antidepressivos em relação às dimensões específicas do ambiente construído em volta – densidade urbana, uso misto do solo, áreas verdes, serviços públicos, acessibilidade por meio de transportes públicos.
As análises foram feitas em Turim, na Itália, e o resultado obtido sobre a incidência de sintomas depressivos entre os adultos, medida pela prescrição de antidepressivos, diminuiu com a melhoria de algumas características específicas do ambiente urbano. Mas, principalmente, aos efeitos da densidade urbana e da acessibilidade ao transporte público. Em ambos os casos, os efeitos foram mais evidentes entre as mulheres e os idosos.
Em conclusão, os resultados da pesquisa sugerem que a distribuição de receitas de antidepressivos é, além de outros fatores conhecidos, sim, influenciada por alguns componentes urbanos. Os elementos da saúde mental devem, portanto, ser levados em conta ao se pensar “políticas urbanas e investir na prestação de serviços que melhoram fatores de resiliência, acima de tudo, investir em uma boa rede de transportes públicos, de uma forma cuidadosa e igualitária em toda a cidade”, destaca o estudo.
Sobre as evidências que apontam efeitos maiores em mulheres e idosos, o estudo indica que deve ser dada atenção aos grupos socialmente vulneráveis. Serviços de acessibilidade e de transporte podem ser facilmente modificados pelos tomadores de decisão como uma medida de compensação quando é impossível fornecer um serviço igualitário para todos. No escopo das bicicletas, falamos sobre a desproporção entre homens e mulheres e como a infraestrutura urbana não é amigável o suficiente para que todas as mulheres se sintam encorajadas a pedalar pela cidade.
Cidades são estruturas complexas, tanto quanto o cérebro humano. No entanto, a identificação de alguns elementos estressantes no ambiente urbano, como a pouca densidade e a falta de acesso ao transporte público, pode ajudar a pensar cidades melhores para as pessoas. Esses elementos podem, portanto, ser levados em conta por urbanistas para beneficiar, a partir do planejamento urbano, a cognição e a nossa saúde mental.
À parte de inúmeras questões cheias de polêmica, que envolvem a forma e os vetores de crescimento da cidade e nossas importantes áreas de preservação ambiental, uma característica do novo Plano Diretor, presente desde muito tempo nas discussões, é o incentivo ao uso misto em amplas áreas da cidade. Seja como solução para a mobilidade, seja como indutor da vida urbana, este incentivo é visto com muito bons olhos por quem estuda os processos de urbanização, por quem conhece ou já viveu, por exemplo, nas densas cidades europeias, cujo ambiente é invejado em todo o mundo.
Morar perto de onde se trabalha, ter um pequeno negócio formal dentro de casa, resolver tarefas do dia a dia sem depender de grandes deslocamentos, permitem que se diminua grande parte das viagens da população, contribuindo para a mobilidade geral da cidade.
Um planejamento urbano com áreas de atividade bem divididas e setorizadas uma vez foi o objetivo dos urbanistas que acabou transcrito em muitos planos diretores e embutido no sonho de cidade de grande parte da população. Hoje é o pesadelo dos gestores das cidades e de quem vive nelas.
Os grandes bairros “de subúrbio”, com casas e prédios exclusivos para moradia já foram o grande sonho de consumo de todo cidadão. Hoje esse sonho impõe às famílias as longas horas no trânsito e a necessidade de usar o carro até para chegar à padaria mais próxima.
O Jornal dos Condomínios já veiculou textos comentando sobre os prejuízos que os grandes condomínios fechados trouxeram para as cidades, trocando a liberdade das ruas pela segurança dos muros altos e sistemas de vigilância particulares. Esta mesma matéria sabiamente esclareceu o quão inevitável esta solução pareceu em muitos casos, mas o quanto inegavelmente contribui para o aumento da insegurança nas ruas e cidades.Da mesma forma, sequencias de condomínios residenciais verticais, com suas portarias espelhadas e fachadas de garagens, resultaram em ruas vazias, desinteressantes, inseguras.
O uso misto foi algo até bastante comum por algum, presente em alguns importantes edifícios da cidade. Galerias comerciais no térreo de edifícios de apartamentos e até escritórios não são exatamente comuns, mas existem espalhados pelo nosso centro mais tradicional. Os ciclos de decadência urbana da região levaram alguns desses edifícios a não figurar como ícones de “desejo de consumo” da população, certamente não por conta dessa saudável mistura de usos. Seguem até hoje densamente ocupados e economicamente saudáveis.
Em contrapartida, áreas da cidade algum dia ricas de vida urbana, com a valorização imobiliária, foram aos poucos se esvaziando, transformando-se “ruas desertas”. Lembro de quão vivas eram até os anos 80 as calçadas da Avenida Beiramar Norte, com seus diversos bares e restaurantes. Hoje, com os condomínios residenciais exclusivos, um após o outro, há trechos em que só se anda em segurança durante o dia.
Vejo temeroso este processo de ocupação se repetir na rua Bocaiúva. Quando surgem novos edifícios residenciais, os térreos que poderiam ser ocupados com pontos comerciais ou de serviços se transformam em meros acesso aos condomínios, onde todos chegam de carro, em portões cegos de garagens.
Recentemente um empreendimento me chamou atenção positivamente. Numa esquina da Avenida Gama d’Eça, no térreo de um prédio de alto padrão, um supermercado veio brindar a vizinhança. Uma esquina que durante a obra parecia estar fadada a virar mais uma “fachada cega” de garagens, acabou virando um “ponto de luz” ao longo da calçada, trazendo comunicação com a cidade, movimento de pedestres e comodidade aos moradores do próprio condomínio e das redondezas.
Essa nova modalidade certamente traz desafios. Aos cidadãos, reconsiderar a ideia de morar em edifícios que não sejam exclusivamente de moradia. A arquitetos, desenvolver projetos bem resolvidos onde o comércio esteja devidamente valorizado e a privacidade de moradores garantida. A síndicos e condôminos, disposição e capacidade para elaborar e administrar regramentos satisfatórios para as diversas atividades. Mas certamente traz também grandes oportunidades.
O uso misto dentro da cidade traz consigo o conceito de “fachada ativa”, no qual uma determinada parcela da frente do lote é destinada a atividades de uso público, que se relacionem com a rua, que ofereçam acesso e serviço ao pedestre. Justamente o contrário das portarias espelhadas, dos pavimentos garagem, que empurram o primeiro olhar “companheiro” para um eventual morador na janela ou sacada vários andares acima da rua.
Além disso, considerando o acesso e uso público, estas fachadas ativas abrem espaço para jardins frontais com mobiliário urbano, abertos ao uso e à circulação das pessoas, estendendo a área tão restrita das nossas calçadas.
No estágio atual da nossa sociedade ou civilização essa ideia ainda pode assustar um pouco, acostumados que estamos a nos “proteger” da vida urbana. Mas é a oportunidade para que os verdadeiros cidadãos tomem posse da cidade, ocupem os espaços coletivamente, transformem as ruas não só em lugar de disputas de trânsito, mas em espaços de circulação e vida.
Evento acontece durante o I Seminário Catarinense pelo Bem-Estar do Paciente Oncológico
Junior
Acontece nos dias 27 e 28 de março, das 19 às 22 horas, no auditório do CESUSC, em Florianópolis, a primeira edição do Projeto “V.I.D.A: Viva Intensamente Depois de Acordar”, com o I Seminário Catarinense pelo Bem-Estar do Paciente Oncológico, criado e idealizado pela advogada Flora Juliani Galvão, especialista na área de medicamentos, e a arquiteta Natália Arruda, especialista em arquitetura e bem-estar.
Sensibilizadas com a realidade dos pacientes portadores de câncer, em tratamento no CEPON, na Capital, elas uniram diversas parcerias para este projeto inovador, que tem como objetivo principal promover a qualidade de vida para os pacientes oncológicos e também familiares. “Diante de milhares de diagnósticos diários dessa doença, e frente à uma realidade indigna e de sobrevida do paciente oncológico, resolvemos unir esforços em prol de um movimento inovador, que tem como objetivo principal a promoção da qualidade dessas pessoas. O Projeto V.I.D.A: Viva Intensamente Depois de Acordar é só o primeiro de inúmeros outros que iremos desenvolver”, afirma Flora.
A palestra ‘Percepção dos pacientes sobre a função do Arquiteto’ terá o foco de apresentar aos pacientes a importância de um ambiente com qualidade e conforto, com isso colocando a arquitetura e o arquiteto como principal responsável pela criação desses espaços e também será reforçada a importância da contratação de um arquiteto para o desenvolvimento de projetos arquitetônicos.
Atualmente temos 55 mil pacientes oncológicos em tratamento no CEPON, alguns são colocados em tratamento paliativo e orientados a ficar em suas residências até o fim deste processo. Dessa forma a residência desses pacientes deverá ter mais atenção quando as questões de habitabilidade e conforto.
Sobre a qualidade dos espaços, habitabilidade, serão abordados assuntos como conforto térmico, acústico e iluminação. O conceito de conforto será entendido como avaliação das exigências humanas, apropriação e identidade dos espaços. Entendendo-se que quanto maior o esforço do paciente em se adaptar ao espaço, maior será a sua sensação de desconforto.
Questões relacionadas a urbanismo também serão abordadas nas palestras, bem como o poder do urbanismo na rotina da sociedade e a forma que ele impacta em outras áreas como: saúde, segurança pública, meio ambiente. A palestra será finalizada com ações práticas para os pacientes aplicarem em suas residências. Serão orientados sobre funcionalidade de layout, iluminação e sensação das cores.
O encontro será nos dias 27 e 28 de março a partir das 19 horas, no auditório do CESUSC. Será aberto ao público em geral, principalmente aos pacientes oncológicos em tratamento, parentes e profissionais da saúde de Santa Catarina. Os palestrantes confirmados são especialistas em diferentes áreas, como saúde, jurídica, arquitetura, psicologia, nutrição e também pacientes oncológicos que venceram a doença. Para participar, a entrada será a doação de 1kg de alimento não perecível, que será entregue para a Casa de Apoio Vovó Gertrudes. O local atende crianças em tratamento oncológico do Hospital Infantil em Florianópolis.
Serviço
O que – Projeto V.I.D.A – Viva Intensamente Depois de Acordar
Onde – auditório do CESUSC – Rodovia SC 401, 9301, Santo Antônio de Lisboa
O Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento de Santa Catarina (IAB-SC) oferece, no dia 24 de março, o curso Introdução – Paisagens de Alta Performance – Infraestruturas Verdes, com o arquiteto e urbanista Marcelo Vassalo, graduado pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) e coordenador do Núcleos São Paulo da Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas (ABAP) e do Núcleo de Boas Práticas da Iniciativa Latino Americana da Paisagem (LALI). O curso tem como objetivo enriquecer o repertório projetual do aluno, abordando conceitos de projeto, com destaque para o paisagismo sustentável.
Através da estrutura verde, é possível integrar sistemas naturais e construídos, criando um ambiente urbano mais saudável e resiliente, auxiliando no manejo das águas, evitando o desperdício, além de benefícios estéticos e uma economia verde.
A programação conta com palestras sobre Biourbanismo, estudos de caso e elementos técnicos e soluções para o paisagismo sustentável. São 20 vagas para o curso de 8 horas/aula, com local a confirmar. Mais informações, programação completa e ficha de inscrição estão disponíveis no site do IAB-SC, ou pelo telefone (48) 3224-4428, das 13h às 19h.
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